Embora conceituemos Iconografia Musical como toda e qualquer representação pictórica que direta ou indiretamente se remeta à arte musical, podemos encontrar curiosos casos nos quais o elemento pictórico se encontra em transcendência para com este conceito se tomado a rigor. Assim ocorre no artifício dos caligramas iconográficos musicais – a exemplo do poema bucólico “A Siringe”, de Teócrito de Siracusa (310 – 250 a.C.), destacado poeta do período helenístico. Em seu poema, Teócrito, no papel de um co-pioneiro (junto a Simias de Rodes, século III a.C.) na tradição do poema figurado, onde a própria configuração do texto ilustra o tema abordado, nos traz a imagem da flauta Syrinx ilustrada pela disposição das palavras no texto poético. Esta arte se perpetuaria até a contemporaneidade, com exemplos que também aqui expomos e comentamos – a exemplo de Guillaume Apollinaire (1880-1918). Considerando também as representações medievais do estilo Ars Subtilior, a exemplo de Baude Cordier e sua partitura no seu rondeaux Belle, Bonne, Sage. O caligrama é um escrito, em geral poético, cuja disposição tipográfica esboça figuras alusivas ao tema tratado. Os primeiros caligramas conhecidos se devem a poetas gregos do chamado período helenístico, século IV a.C. Esta modalidade poética teria uma origem religiosa, no papel de ex-votos ou oferendas, sobre os quais se escreviam o nome do doador e a ocasião da doação em linhas ou versos, que se configuravam na forma do objeto oferecido, a exemplo do poema ‘Ovo’, de Símias de Rodes. Esta técnica foi imitada pelos poetas latinos. O gramático e poeta romano Ausônio (século IV d.C.) chamou a esta técnica literária de ‘technopaegnia’ - τέχνη, techne, art e παíγνιον, pañnion, jogo, que significa “jogo de arte” ou ainda “carmina figurata”. Temos da Idade Média inúmeros exemplos, como manuscrito “Os Feitos dos Apóstolos”, do século X, na Biblioteca Nacional de Paris. Talvez o mais prolífero ‘caligramático’ da Idade Média tenha sido o Monge Beneditino Rabanus Maurus (780–856), com o seu Liber de laudibus sanctae crucis. Ainda da idade Média, De Signaculo Sanctae Crucis (s.VI d.C.) de Venantius Fortunatus. O Renascimento veio revitalizar o gênero, como parte do resgate dos valores clássicos. Imitando os antigos, em latim, grego ou vernáculo, com nomes como Julio César Scaligero (1484-1558) e Jacques Cellier, século XVI. Encontramos, em Rabelais, numa edição de 1565, um caligrama ilustrativo para a Prece de Panurgo à Deusa Garrafa. De Robert Angot, século XVII, um bandolim – “Lira de Minerva”, apaziguadora das aflições e das dores. Como exemplo germânico de caligramas no período barroco, de Johannes Steinman e Theodor Kornfeld, ambos do século XVII, respectivamente, ‘O corne da beatitude’ e ‘A Areia’ – representação de uma ampulheta.